Blog do Paraíso: A tragédia de Rali (V parte)

quarta-feira, 27 de junho de 2007

A tragédia de Rali (V parte)



Há quem diga que amizade não existe. Outros afirmam que o título de amigo é muito grande para uma pessoa. No meu entender, quem pensa assim é covarde. Tem medo de ser traído ou de se frustrar com um amigo. Existe essa possibilidade, não nego. Mas se você não correr o risco, perderá também a oportunidade de experimentar as coisas boas da amizade.

Outra coisa que não se deve esquecer é que um amigo, antes de tudo, também é humano. Do ser humano deve se esperar tudo. Mentira, falsidade, traição, tudo. Afinal, não é um Deus. É muito complicado ter um amigo, quando não se olha para si mesmo. Principalmente, perdoá-lo.

Eu tenho um amigo. Não tenho medo de dizer, não sou covarde. João é o meu amigo. A aparência dele combina com o nome. Parrudo. Talvez essa seja a palavra que se enquadra ao físico de João. Talvez seja por isso também que ninguém nunca o chamou de Joãozinho.

João é uma espécie apta. Está vivo porque passou pala seleção natural da vida. Pois a mãe dele, Maria Caipralá, teve 17 filhos. Por falta de comida, cinco morreram. Outros cinco foram abortados com métodos caseiros pela mãe. Somente sete sobreviveram. João foi um deles. Como eu, ele e a família vieram do interior, foram morar num barraco caindo os pedaços na cidade-favela da Ceilândia. Depois de não pagarem o aluguel de três meses, foram despejados. Para não ficarem de baixo da ponte, a solução encontrada foi invadir, junto com outras famílias, a Estrutural.

Com quatro anos de idade, João chegou à Estrutural. Aos sete, em vez de ir para a escola, foi para os sinais de trânsito vender doces para ajudar na renda de casa. João não conheceu o pai, assim como os outros seis irmãos maternos que sobreviveram a seleção natural.

Como você, leitor, deve ter percebido, a família de João era mais pobre que a minha.

Para ser sincero, não me lembro como foi que falei pela primeira vez com João. Pois eu só tinha quatro anos. Porém, lembro que nossas brincadeiras eram bastante divertidas. A preferida era pique-esconde, até a gente completar 12 anos. Depois, as brincadeiras já não eram mais de criança...

Com 12 anos, entrei no mundo das drogas. E digo que não foi por influência do meu amigo. Isso é conversa fiada. Porém, muitos pais abestados acreditam.

Comecei com álcool, depois cigarro. Em seguida, maconha. Por fim, cocaína e merla. Não cheguei a usar outras drogas sintéticas por falta de grana. Somente a classe média tem esse privilégio.

Continua...

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