Blog do Paraíso: Capítulo XIV

domingo, 2 de agosto de 2009

Capítulo XIV

Indignado, Bruno, pensava, não podia deixar barato o tapa que Tião lhe deu na face. Para ele, não havia no mundo ofensa tão grande quanto uma agressão como essa. Para Bruno, nenhum homem veio ao mundo para apanhar na cara, ainda mais de outro homem. Jesus, segundo os relatos bíblicos, ensinou que, quando alguém lhe der um tapa na face, ofereça a outra. “Só que eu não sou Jesus”, refletia. Bruno nunca entendeu e nunca aceitou o ensinamento de Cristo. Tinha, portanto, que fazer justiça com as próprias mãos. Tinha que ensinar Tião a “respeitar a cara de homem”.

Depois sofrer a agressão, Bruno e Pedro foram para outra cidade. Eles tinham sido convidados para um “frevo” de um chegado. Lá, se divertiram até de madruga. Só que, no final da festa, Pedro percebeu algo de errado em seu primo.

- Ué, bicho? O que você tem?
- Tô pensando aqui. Aquele tapa não vai ficar de graça.
- Moço, deixa isso quieto! Aquele bicho lá não é flor que se cheira. Ele é malandro. É o maior bandido daquela quebrada.
- Eu também sou malandro. E vou ensinar para ele respeitar a cara de homem.
- O que aconteceu? – perguntou Alan, o chegado de Bruno e Pedro, dono do “frevo” e que se aproximou dos dois jovens durante a conversa.
- Não é nada – disse Pedro, para evitar mais confusão, pois sabia que Alan poderia tomar as dores de Bruno.

Mais conhecido por “Tim Maia”, Alan comandava o tráfico de drogas naquela região. Usava sempre boné aba reta. Pesava um pouco mais de 120 quilos. Era negro e tinha uma voz grave.

- Foi um comédia de lá da quebrada que entrou numas comigo – contou Bruno, ansioso por receber o apoio de Tim Maia.
- O cara é mó folgado – Bruno prosseguiu –. Eu tava de boa e ele meteu a mão na minha cara só porque tive um desacerto com um chegado dele.
- Oxe, mano. Se você quiser, vamo lá agora ver de qual é. Tô com uma pistola aí. A gente pega o carro e vai lá descarregar ela todinha naqueles comédias.
- Demorou!
- Calma! O cara lá anda armado também. Ele é malandrão lá na quebrada.
- Tá com medo Pedro? – Tim Maia perguntou.

Pedro não respondeu. Ficou calado e imaginando a confusão que Tim Maia e Bruno poderiam fazer na rua onde morava. Apenas ele, que vivia há anos naquela rua, sabia que o pessoal da parte de cima não gostava do pessoal da parte de baixo. E se Bruno, que estava na casa de Pedro, mexesse com Tião, isso poderia reacender a guerra entre os dois lados.

- Iiii. Demorou de mais pra responder. Deve tá com medo.
- Tá me estranhando é? Faz tempo que eu queria baixar a crista do Tião. Vamos lá.
- Calma aí, me ajudem a arrumar metade dessa bagunça aqui. Vamos deixar para ir tipo umas 10h. Acho que os caras não vão estar na rua uma hora dessa – Tim Maia olhou para o relógio –, 5h da madruga.

Tim Maia estava enganado. Hamixiaire, Jacinto, Marciano e Tião, acompanhados por Bruna e Camila, ainda estavam na rua naquela hora. O volume da música continuava alto, perturbando a paz dos vizinhos. Havia ainda umas 15 garrafas de cerveja do segundo engradado que os jovens compraram. Aliás, que Tião comprou com o dinheiro lucrado com a venda de maconha e cocaína.

Todos já estavam "doidões", inclusive, as duas jovens. Bruna ficou com Tião e Camila estava com Jacinto. Enquanto Marciano morria de inveja, as duas rebolavam e dançavam em volta de Tião e Jacinto. Hamixiaire não ligava muito. Queria só passar o tempo.

- Tá vendo aí? – Marciano perguntou para Hamixiaire.
- O que?
- Essas duas putinhas aí. Só ficam com quem não presta. Maria oitão. Só gosta de malandro. Duvido se eu fosse malandro, se elas não estariam pagando pau para mim.
- Ah, Marciano! Você não pega ninguém porque você é feio e muito chato e, não, porque não é malandro.
- Se liga, bicho! E você? Seu Zé Pedófilo.
- Ai, ai,ai. Lá vem você de novo com essa história. Esquece isso, cara.

Sempre que podia, Marciano pegava no pé de Hamixiare, comentando a fama que ele tinha na quadra de pedófilo. Os dois passavam horas discutindo. Marciano acusando e Hamixiaire negando.

- Bom dia!
- Bom dia, seu João – Marciano respondeu. Hamixiaire ficou calado. Jacinto e Tião estavam ocupados.
- Tá vendo aí? – disse Marciano a Hamixiaire, apontando para o pai de Gabriela que subia para o ponto de ônibus –. O João podia te moer no cacete, seu safado.
- É só ele vim. Eu não tenho medo dele não, Marciano.
- Não tem o que, rapaz? Eu lembro muito bem naquele dia que você correu de medo dele. Se não fosse o Tião, era perigoso você nem estar mais aqui.

Enquanto Marciano e Hamixiaire discutiam, Tião e Jacinto se distraíam com Bruna e Camila. Por volta de umas 10h, um caro veio se aproximando deles. Os jovens só notaram a presença do veículo quando ele parou. Era um opala, com vidro fumê. Mas era possível ver o motorista, pois a janela estava aberta. Só que a atenção dos jovens não ficou voltada para o homem gordo que conduzia o caro. A atenção dos jovens foi toda para a pistola automática que ficou do lado de fora naquele momento.

Tim Maia apertou o gatilho...

Um comentário:

Natália Vergütz disse...

A riqueza em detalhes faz a gente viajar na história e dá a impressão de que ela é até mesmo verídica!