Lendo um editorial de um jornal com grande circulação nacional – grande se comparado com os demais, mas pífia se comparado com a quantidade de brasileiros economicamente ativos –, me veio a vontade e a inspiração para escrever este texto. O editorial trata da Empresa Brasil de Comunicação (EBC).
Ao ler o artigo, lembrei do dia em que acordei cedo, desanimado e atrasado para fazer a prova de seleção de estagiário da extinta Radiobrás. Isso foi no final de 2006, quando eu tinha acabado de cursar o quarto semestre do Curso de Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo. Estava desanimado porque pensava que não ia ser aprovado, afinal, eu nunca na vida tinha escrito um texto para TV e a prova que eu tinha escolhido iria, conforme o edital, conter questões sobre o texto televisivo.
Escolhi esse tipo de prova porque tinha muita vontade de trabalhar numa TV, além disso, pensava que o teste só ia ser aplicado no início de 2007, quando eu já teria começado a estudar a disciplina de telejornalismo.
Ainda assim, fui fazer a prova, mais uma vez, por pura curiosidade. Queria saber o que eles iriam me perguntar.
O teste foi aplicado na Universidade de Brasília (UNB). Foram apenas três questões discursivas. A prova era humanamente possível de ser respondida, diferente de outra prova, com dezenas de questões complicadíssimas, que fiz, pela internet, para estagiar em outra televisão. Desconfio até que a prova dessa outra televisão era apenas fachada, pois, na verdade, só entra lá quem tem um peixe forte ou é superdotado.
Desci correndo da L2 Norte para o Campus da UNB, pensando que estava atrasado. Mas, quando cheguei, com gostas de suor na testa, vi que a seleção ainda não tinha começado. Os portões sequer estavam abertos. Fiquei mais tranquilo. Minutos depois, conferi minha sala e fui realizar o teste.
Achei as questões fáceis. A primeira pergunta pedia para ler um pedaço da degravação do programa Café com o Presidente e fazer um texto para TV. Fiz uma nota. A segunda já nem lembro mais. A terceira era pessoal, tipo para saber se você é gente boa. Fui um dos primeiros a responder e a entregar.
Quando saiu o resultado, vi que estava aprovado, porém, o meu nome aparecia no pé da lista. Dois anos depois, no início de 2008, quando já estava editada a Medida Provisória que criou a EBC; quando eu já tinha esquecido da provava; quando eu já tinha feito a disciplina de telejornalismo; me ligaram e me perguntaram se eu ainda queria fazer o estágio. O tempo havia passado, mas eu ainda não tinha trabalhado numa redação de TV, portanto, minha curiosidade ainda existia, logo, aceitei.
A expectativa era muito grande. Pensava que ia chegar lá, pegar um microfone e ir para a rua, acompanhado de um cinegrafista. Tinha até esquecido que era estagiário. No entanto, não foi bem assim. Fui jogado numa tal de NBR. Nunca tinha ouvido falar. Nem sabia o significado da sigla. Hoje sei. Quer dizer “Nacional Brasil”.
A TV era tão precária, mais tão precária, que não tinha sequer uma redação própria. Ficava misturada com a redação da TV Brasil, usava os equipamentos da TV Brasil.
Minha função lá era atualizar tudo que aparecia no monitor da NBR. Quem nunca assistiu à Nacional Brasil, nem imagina do que estou falando. Mas eu explico. Na época que passei por lá, o grande lance da NBR era transmitir, ao vivo, os eventos do presidente Lula ou de seus ministros. Enquanto isso não acontecia, a Nacional passava, depois repetia, incansavelmente, documentários e alguns programas. Além disso, no canto direito do monitor ficava uma coluna de texto com a agenda dos ministros. Atravessando a tela, tinha uma linha onde corriam frases sobre a agenda e as atividades do presidente. Abaixo dessa linha, ficava ainda uma barra, onde subiam notícias referentes ao governo federal. Sobrava, para as imagens, portanto, apenas um pequeno quadrado.
Confesso. Quando vi que era lá, e naquela função, que eu ia trabalhar, senti vontade de pedir demissão e ir embora. Mas não. Fiquei. Eram só quatros horas. O valor da bolsa (salário) era baixo, mas valia a pena. Fiquei, portanto.
No começo, desconfiava que nenhum ser humano, além de mim, lia as informações que eu atualizava no monitor. Descobri depois que estava errado. Quando eu deslizava no português, assim como acontece, de vez em quando neste Blog, meus chefes me ligavam e pediam para eu corrigir o erro. Isso me fez ficar mais atento.
Para atualizar as informações, eu tinha que acessar os sites de todos os ministérios, fundações, bancos, enfim, sites que eu pensava que jamais frequentaria.
Para publicar informações quentes, passei, por iniciativa própria, a assistir às transmissões, ao vivo, das atividades do presidente Lula. Quando isso acontecia, muitos colegas ficavam putos, pois o áudio do aparelho de TV que eu usava era desregulado. Quando não estava muito baixo, a ponto de quase nada ser ouvido, ficava muito alto, e toda redação ouvia. Só que eu não estava nem aí.
Depois que virou lei a criação da EBC, mais gente foi contratada, porém, o espaço permaneceu o mesmo. Eu tinha que ficar disputando computador com repórteres, editores e produtores. Foi uma época muito complicada, mas durou pouco tempo. A redação da NBR foi transferida para o segundo andar do prédio. O espaço não era só dela. Tinha que dividir com a redação da Voz do Brasil.
Quando a redação da NBR mudou, eu também mudei de função. Passei a trabalhar na produção. Acho que, ao publicar informações quentes do Lula, meus chefes perceberam o meu esforço e, por isso, resolveram me dar uma oportunidade, me colocando em outra atribuição.
Com a nova função, passei a navegar mais ainda nos sites oficiais do Governo Federal, à procura de novidade. Aprendi a produzir pautas observando o trabalho dos meus colegas. Nunca tive vergonha de perguntar.
Só que aprendi também a sofrer junto com eles. Tudo que dava de errado era culpa da produção, pelo menos era o que dava a entender. Parecia que o que tinha de pior na redação era a produção. Os repórteres não tinham um pingo de respeito pelos produtores. Alguns chegavam até a dizer que não iam fazer a pauta.
Sem contar o dilema que a produção vivia. Quando não tinha pauta, sobravam equipes e repórteres. Mas, quando tinha pauta, faltavam equipes ou repórteres.
Eu me esforçava o máximo. Procurava personagens. Fazia sugestões de perguntas e encaminhamentos. Tentava dar um enfoque que mostrasse a importância do assunto para o cidadão. Chegava a passar duas, três, quatro horas produzindo uma pauta. Faltava só cortar os pulsos e derramar meu sangue em cima da pauta, como oferenda de meu sacrifício.
Mas, quando o repórter recebia a pauta, com as pontas dos dedos, e dizia “muito fraco”, parecia que todo o meu esforço tinha sido em vão. Parecia não, meu esforço tinha sido em vão, principalmente, quando a pauta não era feita.
Teve uma vez que eu não aguentei. Ouvi certa vez um repórter falando mal de minhas pautas. Então, eu perguntei. “Por que você não troca? Vira produtor e vem nos ensinar, assim eu também aprendo com você”. Gente, o cara virou uma fera. Insultou toda a equipe dizendo que nosso trabalho não chegava aos pés de uma produção de verdade...
Bom. São lembranças de um passado recente que eu relembro agora, depois de ler um artigo de um jornal famoso. De acordo com o editorial, a EBC tem um orçamento de R$ 350 milhões. O texto dá a entender que o dinheiro serve apenas para custear os “cabides de emprego”. Para o editorial, portanto, a TV Brasil (ele não cita a NBR) deve ser fechada, “antes que se desperdice mais dinheiro do contribuinte”.
A opinião do artigo reflete total desconhecimento ao valor da Comunicação Pública. Talvez, se quem escreveu o texto tivesse passado o que passei, jamais o escreveria.
Ao ler o artigo, lembrei do dia em que acordei cedo, desanimado e atrasado para fazer a prova de seleção de estagiário da extinta Radiobrás. Isso foi no final de 2006, quando eu tinha acabado de cursar o quarto semestre do Curso de Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo. Estava desanimado porque pensava que não ia ser aprovado, afinal, eu nunca na vida tinha escrito um texto para TV e a prova que eu tinha escolhido iria, conforme o edital, conter questões sobre o texto televisivo.
Escolhi esse tipo de prova porque tinha muita vontade de trabalhar numa TV, além disso, pensava que o teste só ia ser aplicado no início de 2007, quando eu já teria começado a estudar a disciplina de telejornalismo.
Ainda assim, fui fazer a prova, mais uma vez, por pura curiosidade. Queria saber o que eles iriam me perguntar.
O teste foi aplicado na Universidade de Brasília (UNB). Foram apenas três questões discursivas. A prova era humanamente possível de ser respondida, diferente de outra prova, com dezenas de questões complicadíssimas, que fiz, pela internet, para estagiar em outra televisão. Desconfio até que a prova dessa outra televisão era apenas fachada, pois, na verdade, só entra lá quem tem um peixe forte ou é superdotado.
Desci correndo da L2 Norte para o Campus da UNB, pensando que estava atrasado. Mas, quando cheguei, com gostas de suor na testa, vi que a seleção ainda não tinha começado. Os portões sequer estavam abertos. Fiquei mais tranquilo. Minutos depois, conferi minha sala e fui realizar o teste.
Achei as questões fáceis. A primeira pergunta pedia para ler um pedaço da degravação do programa Café com o Presidente e fazer um texto para TV. Fiz uma nota. A segunda já nem lembro mais. A terceira era pessoal, tipo para saber se você é gente boa. Fui um dos primeiros a responder e a entregar.
Quando saiu o resultado, vi que estava aprovado, porém, o meu nome aparecia no pé da lista. Dois anos depois, no início de 2008, quando já estava editada a Medida Provisória que criou a EBC; quando eu já tinha esquecido da provava; quando eu já tinha feito a disciplina de telejornalismo; me ligaram e me perguntaram se eu ainda queria fazer o estágio. O tempo havia passado, mas eu ainda não tinha trabalhado numa redação de TV, portanto, minha curiosidade ainda existia, logo, aceitei.
A expectativa era muito grande. Pensava que ia chegar lá, pegar um microfone e ir para a rua, acompanhado de um cinegrafista. Tinha até esquecido que era estagiário. No entanto, não foi bem assim. Fui jogado numa tal de NBR. Nunca tinha ouvido falar. Nem sabia o significado da sigla. Hoje sei. Quer dizer “Nacional Brasil”.
A TV era tão precária, mais tão precária, que não tinha sequer uma redação própria. Ficava misturada com a redação da TV Brasil, usava os equipamentos da TV Brasil.
Minha função lá era atualizar tudo que aparecia no monitor da NBR. Quem nunca assistiu à Nacional Brasil, nem imagina do que estou falando. Mas eu explico. Na época que passei por lá, o grande lance da NBR era transmitir, ao vivo, os eventos do presidente Lula ou de seus ministros. Enquanto isso não acontecia, a Nacional passava, depois repetia, incansavelmente, documentários e alguns programas. Além disso, no canto direito do monitor ficava uma coluna de texto com a agenda dos ministros. Atravessando a tela, tinha uma linha onde corriam frases sobre a agenda e as atividades do presidente. Abaixo dessa linha, ficava ainda uma barra, onde subiam notícias referentes ao governo federal. Sobrava, para as imagens, portanto, apenas um pequeno quadrado.
Confesso. Quando vi que era lá, e naquela função, que eu ia trabalhar, senti vontade de pedir demissão e ir embora. Mas não. Fiquei. Eram só quatros horas. O valor da bolsa (salário) era baixo, mas valia a pena. Fiquei, portanto.
No começo, desconfiava que nenhum ser humano, além de mim, lia as informações que eu atualizava no monitor. Descobri depois que estava errado. Quando eu deslizava no português, assim como acontece, de vez em quando neste Blog, meus chefes me ligavam e pediam para eu corrigir o erro. Isso me fez ficar mais atento.
Para atualizar as informações, eu tinha que acessar os sites de todos os ministérios, fundações, bancos, enfim, sites que eu pensava que jamais frequentaria.
Para publicar informações quentes, passei, por iniciativa própria, a assistir às transmissões, ao vivo, das atividades do presidente Lula. Quando isso acontecia, muitos colegas ficavam putos, pois o áudio do aparelho de TV que eu usava era desregulado. Quando não estava muito baixo, a ponto de quase nada ser ouvido, ficava muito alto, e toda redação ouvia. Só que eu não estava nem aí.
Depois que virou lei a criação da EBC, mais gente foi contratada, porém, o espaço permaneceu o mesmo. Eu tinha que ficar disputando computador com repórteres, editores e produtores. Foi uma época muito complicada, mas durou pouco tempo. A redação da NBR foi transferida para o segundo andar do prédio. O espaço não era só dela. Tinha que dividir com a redação da Voz do Brasil.
Quando a redação da NBR mudou, eu também mudei de função. Passei a trabalhar na produção. Acho que, ao publicar informações quentes do Lula, meus chefes perceberam o meu esforço e, por isso, resolveram me dar uma oportunidade, me colocando em outra atribuição.
Com a nova função, passei a navegar mais ainda nos sites oficiais do Governo Federal, à procura de novidade. Aprendi a produzir pautas observando o trabalho dos meus colegas. Nunca tive vergonha de perguntar.
Só que aprendi também a sofrer junto com eles. Tudo que dava de errado era culpa da produção, pelo menos era o que dava a entender. Parecia que o que tinha de pior na redação era a produção. Os repórteres não tinham um pingo de respeito pelos produtores. Alguns chegavam até a dizer que não iam fazer a pauta.
Sem contar o dilema que a produção vivia. Quando não tinha pauta, sobravam equipes e repórteres. Mas, quando tinha pauta, faltavam equipes ou repórteres.
Eu me esforçava o máximo. Procurava personagens. Fazia sugestões de perguntas e encaminhamentos. Tentava dar um enfoque que mostrasse a importância do assunto para o cidadão. Chegava a passar duas, três, quatro horas produzindo uma pauta. Faltava só cortar os pulsos e derramar meu sangue em cima da pauta, como oferenda de meu sacrifício.
Mas, quando o repórter recebia a pauta, com as pontas dos dedos, e dizia “muito fraco”, parecia que todo o meu esforço tinha sido em vão. Parecia não, meu esforço tinha sido em vão, principalmente, quando a pauta não era feita.
Teve uma vez que eu não aguentei. Ouvi certa vez um repórter falando mal de minhas pautas. Então, eu perguntei. “Por que você não troca? Vira produtor e vem nos ensinar, assim eu também aprendo com você”. Gente, o cara virou uma fera. Insultou toda a equipe dizendo que nosso trabalho não chegava aos pés de uma produção de verdade...
Bom. São lembranças de um passado recente que eu relembro agora, depois de ler um artigo de um jornal famoso. De acordo com o editorial, a EBC tem um orçamento de R$ 350 milhões. O texto dá a entender que o dinheiro serve apenas para custear os “cabides de emprego”. Para o editorial, portanto, a TV Brasil (ele não cita a NBR) deve ser fechada, “antes que se desperdice mais dinheiro do contribuinte”.
A opinião do artigo reflete total desconhecimento ao valor da Comunicação Pública. Talvez, se quem escreveu o texto tivesse passado o que passei, jamais o escreveria.
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