Os líderes
O caput do Art. 9º do Regimento Interno determina que somente os deputados agrupados por partido ou blocos parlamentares compostos por um centésimo dos membros da Câmara poderão escolher um líder. A regra, porém, foi praticamente anulada depois que a ex-senadora do PSOL Heloisa Helena entrou com uma Adin no Supremo Tribunal Federal (STF) para seu partido ter o direito de escolher um líder. O Supremo acatou a Ação.
Mesmo assim, a regra do Art. 9º continua valendo. O partido ou bloco que for composto por um centésimo de deputados da Câmara – 513 dividido por 100 é igual a 5,13, mas, geralmente, o número é arredondado para cima; portanto, 6 – tem direito a escolher um líder e, para cada quatro parlamentares, um vice-líder.
O PT, por exemplo, tem 20 vice-líderes porque 79 dividido por quatro é igual a 19,75. E dos 20, somente um é chamado de 1º vice-líder, geralmente é o deputado que também estava concorrendo para ser líder.
Os vice-líderes são encarregados de marcar presença nas comissões, pois, conforme o inciso III do Art. 10, somente eles e o líder podem participar dos trabalhos de “qualquer comissão de que não seja membro, sem direito a voto, mas podendo encaminhar a votação [veja Art. 192] ou requerer verificação desta [veja Art. 185]”. Essa atribuição é bastante importante porque é por meio dela que um partido consegue obstruir uma votação.
No próximo capitulo, veremos as regras das sessões do Plenário, que também valem para as Comissões, mas, para explicar a estratégia dos líderes e vice-líderes de obstrução de uma votação, vamos antecipar aqui alguns procedimentos realizados nas reuniões e sessões – pois os procedimentos também acontecem nas Comissões, se fossem apenas no Plenário, eu escreveria somente “procedimentos realizados nas sessões”.
A reunião de uma determinada comissão passa por dois momentos: a discussão e, depois, a votação do projeto. A votação possui três fases. Na primeira, encaminha-se o projeto. Na segunda, os líderes dão a orientação de bancada (inciso IV do Art. 10 e parágrafo 2º do Art. 192). Por fim, na terceira fase, a votação do projeto, que pode ser ostensiva ou secreta.
Quando é secreta, a votação do projeto é feita por meio do sistema eletrônico ou, se o sistema der pau, por meio de cédula – a última votação secreta foi realizada em março de 1992 para cassar o mandato do deputado Manoel Moura que, conforme o Art. 237, estava “em caso de incapacidade civil absoluta”.
Se a votação for ostensiva, há dois procedimentos. Um é a regra geral da Casa, chamado de votação simbólica. É quando o presidente questiona se o projeto está aprovado e ninguém fala nada, todos permanecem sentados (Art. 185). O presidente da Mesa, portanto, declara aprovado o projeto.
É por isso que, às fezes, assistindo a uma votação, ficamos admirados com a rapidez que os projetos são votados. Se tiver algum deputado contra, ele tem que ficar bem atento, porque, depois de aprovado, a Mesa não volta atrás. A matéria é considerada “vencida”.
Mas, se pelo menos um deputado se levantar e dizer que é contra a aprovação do projeto, a comissão realizará o segundo procedimento: a verificação de voto, feita por meio do sistema eletrônico (se não der pau) ou por chamada nominal (cada deputado é chamado e questionado sobre o voto. É mais ou menos assim. O presidente chama o deputado fulano, que rapidamente responde “sou contra” ou “sou a favor”. Depois, o presidente chama o deputado sicrano, que dá a resposta e assim sucessivamente).
A verificação de voto possui duas regras. De acordo com o parágrafo 3º do Art. 185, a primeira regra é automática e determina que só haverá verificação de voto “se seis centésimos dos membros da Casa ou Líderes que represente este número apoiarem o pedido”. Aplicada somente uma vez para cada hora depois do resultado da verificação anterior, a regra é automática porque não precisa da deliberação do Plenário da comissão e é por meio dela que se faz obstrução da votação.
Para ficar mais claro, vou citar o exemplo do Projeto de Lei (PL) 3674/08, elaborado pelo Poder Executivo e que cria o Fundo Soberano do Brasil. O PL estava tramitando com regime de urgência constitucional, portanto, trancava a pauta. A Minoria – PSDB e DEM – ameaçou o governo obstruir a votação, se o regime de urgência não fosse retirado do PL. O governo não quis.
A Minoria, portanto, pediu verificação de voto em todas as vezes que tinha direito, o que é feito, como descrito acima, de hora em hora. O resultado: passaram-se três sessões (o equivalente a 15h) e o PL ainda não tinha sido aprovado. O governo teve que entrar num acordo e retirou o regime de urgência do Projeto de Lei. A partir daí, fica mais claro porque o Regimento Interno serve para proteger a Minora.
Entendido como funciona a obstrução, vamos entender como funciona a segunda regra para a verificação de voto. Regra que também poderia ser usada para obstruir a votação, se não fosse o ardil do presidente da Mesa.
Segundo o parágrafo 4º do Art. 185, um décimo dos deputados ou um líder que represente esse número podem pedir verificação de voto antes de passar uma hora da divulgação do resultado da verificação anterior, mas com uma condição: por deliberação do Plenário.
Na prática, haverá verificação de voto antes de passar uma hora da divulgação do resultado da verificação anterior só se o presidente da comissão quiser. O líder pode pedir verificação do voto e o presidente não aprovar, ainda que de sua mesa ele veja os demais membros da Comissão com a mão levantada a favor da verificação do voto. “A visão que eu tenho daqui é diferente da visão que você tem daí”, ele pode alegar para o líder.
Mas deixemos essas artimanhas de lado e voltemos para as “prerrogativas” dos líderes e vice-líderes. No inciso II do Art. 10, o Regimento atribui à liderança do partido a função de “inscrever membros da bancada para o horário destinado às Comunicações Parlamentares”, mas não diz o número de deputados que deverão ser indicados. Comumente, são indicados dois membros do partido.
O mandato de um líder é determinado pelo partido ou bloco que ele pertence (parágrafo 3º, Art. 9º). Em outras palavras, não tem limite de tempo. Mais duas coisas interessantes. O líder não leva falta – regra que não é prevista no Regimento Interno – e, assim como os vice-líderes, não pode integrar a Mesa Diretora (parágrafo 5º, Art. 9º), mas pode ser membro de comissão – geralmente, não é.
O líder é o responsável por “indicar à Mesa os membros da bancada para compor as Comissões, e, a qualquer tempo, substituí-los” (VI do Art. 10). É importante destacar que o deputado tem o direito de participar da comissão e, não, o dever.
A liderança do governo pode ser escolhida pelo presidente da República, conforme assegura o Art. 11. No entanto, o Regimento não especifica se a liderança do governo tem que ser do mesmo partido, portanto, o líder e os cinco vice-líderes, que o Art. 11 assegura ao governo, podem ser de partidos diferentes.
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