Blog do Paraíso: Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço

Por Alexandre Guimarães, jornalista e consultor Legislativo do Senado Federal das áreas do Esporte e Turismo.

A Copa do Mundo no Brasil já pode ser aclamada como a mais controversa de todos os tempos. Agora a discussão surge com relação ao Projeto de Lei nº 2.330/2011, a chamada Lei Geral da Copa, cujo relatório apresentado pelo Deputado Vicente Cândido (PT-SP) deve ser votado na Comissão Especial da Câmara dos Deputados no próximo dia 13.

O Substitutivo apresentado traz entre avanços e regressos dois pontos que chamam atenção por serem, pelo menos, contraditórios. Primeiramente, com louvor, acrescenta-se um Capítulo que trata de “Campanhas Sociais nas Competições”; e o art. 30, inciso I, pretende que seja divulgada uma campanha com o tema social “Por um mundo sem armas, sem drogas e sem violência”, bela iniciativa mas estranhamente contraditada por outros dispositivos acrescentados na proposição.

No texto, o artigo anterior (art. 29) tira qualquer dúvida sobre a permissão da venda e do consumo de bebidas alcoólicas nos Estádios durante a Copa das Confederações 2013 e a Copa do Mundo 2014, ela passa a ser permitida livremente “em bares, restaurantes ou estabelecimentos similares nos locais dos Eventos”. Alguém pode argumentar que não há problema, é apenas para essas competições, para satisfazer a sede dos turistas que em seus países estão acostumados com a bebida nos Estádios. Argumento falacioso, porém bastante utilizado nos últimos dias. Ademais, muito melhor do que expor que uma dos patrocinadores das competições é uma das mais vendidas cervejas do mundo.

No entanto, não é só isso. Para que não haja a discriminação com as demais competições nacionais, o Substitutivo propõe um passo atrás na questão das bebidas alcoólicas: em seu art. 34, acrescenta um art. 13-B ao Estatuto do Torcedor, passando a permitir o mesmo para as competições nacionais.

Por que retroceder? O álcool não é droga? Sou consumidor de bebidas alcoólicas e fumante. Aprendi que ambas são drogas lícitas, mas não deixam de ser drogas. Pesquisas nacionais e internacionais mostram que álcool e cigarros estão ligados e estes são portas de entrada ao uso de outras drogas ilícitas. No Brasil, segundo pesquisas, cerca de 52% dos brasileiros com mais de 13 anos (isso mesmo, desde os menores!) que ingerem bebidas alcoólicas também fumam. A Organização Mundial de Saúde diz que cerca de 2,5 milhões de pessoas morrem vítimas do álcool no mundo todos os anos.

No mundo atual, não se compreende que ainda haja competições esportivas que tenham por patrocinadores bebidas alcoólicas ou marcas de cigarro, tanto que estes já foram abolidos de todas, até da tradição da Fórmula 1, onde vimos nossos mitos serem campeões em carros que eram cópias de embalagens de tradicionais cigarros. Ou o mundo está se conscientizando de que não se deve mais fazer publicidade, ainda que implícita, de drogas (mesmo das lícitas), ou o lobby das cervejarias é melhor do que o lobby do tabaco!

Como já disse, sou apreciador de bebidas alcoólicas e fumo charutos (sei dos males que me faz e sou contra o incentivo a que mais pessoas bebam e fumem!); no entanto, amo futebol e estar em presente nos jogos! Nada melhor do que a vibração da torcida no Estádio! E, nos últimos anos, aprendi, como todos os demais torcedores, que posso torcer sem estar alcoolizado! Não vi nenhum torcedor morrer pela abstinência do álcool durante uma partida de futebol, mas vi diminuir substancialmente confusões e violência nos Estádios. Será que há alguma relação com os avanços que o Estatuto do Torcedor trouxe ao futebol nacional?

Não há, pois, porque regredir! Se queremos fazer uma campanha por um mundo sem drogas comecemos dando o exemplo ao mundo de que, em nossos Estádios, não fazemos uso de bebidas alcoólicas! Ou então, a campanha correta a ser lançada é “Por um mundo sem armas, sem drogas ilícitas e sem violência exceto aquela dentro e fora dos estádios!”. Distribuamos, também, kits hooligans, com direito a mastros de bandeira feitos de cabo de vassoura (esqueci de dizer, também voltam a ser permitidos, pela mudança feita pelo art. 33 do Substitutivo ao texto do art. 13-A, inciso IV, do Estatuto do Torcedor).

Ninguém mais pode reclamar de legado desses Eventos. Eis, finalmente, dois legados certos da Copa do Mundo no Brasil: a volta da violência nos Estádios e o incentivo implícito ao consumo de bebidas alcoólicas (e viva o lobby das cervejarias!). Por que não mudar a Lei Seca, ainda dá tempo de incluir artigo proibindo que motoristas sejam punidos pelo uso de bebidas alcoólicas!

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